A derrota militar de Israel é possível
Até o ano passado, era difícil pensar a possibilidade de uma derrota militar de Israel em sua guerra permanente genocida contra o povo palestino. Hoje, importantes intelectuais, como Ilan Pappe, já preveem o colapso de Israel ou sua derrota militar a curto prazo. 1 Por: Jose Welmowick, Jorge Martinez e Américo Gomes A crise no

Até o ano passado, era difícil pensar a possibilidade de uma derrota militar de Israel em sua guerra permanente genocida contra o povo palestino. Hoje, importantes intelectuais, como Ilan Pappe, já preveem o colapso de Israel ou sua derrota militar a curto prazo. 1
Por: Jose Welmowick, Jorge Martinez e Américo Gomes
A crise no governo de Netanyahu e no Estado de Israel já existia antes do ataque do Hamas em 7 de outubro, no entanto, o ataque daquele dia e a resistência palestina, que não é derrotada depois de 8 meses de combate, estão agravando-a.
Além da heroica resistência palestina, as grandes manifestações internacionais, principalmente nos países imperialistas e algumas ações dos trabalhadores destes países, desmascararam o governo israelense e potencializam a grave instabilidade política em Israel.
A política do imperialismo de impor um enclave sionista em uma região de árabes e muçulmanos no Oriente Médio pode estar à beira de uma derrota histórica. Um dado que Ilan Pappé chama a atenção é sobre o número de judeus israelenses que estão deixando o país, preocupados com a segurança. Ele calcula em uns 500 mil israelenses tomando essa atitude, ou seja cerca de 10% da população judaica. O ex-primeiro-ministro Naftali Bennet publicou um chamado emocional para que os judeus não abandonem Israel neste momento delicado. 2
Do ponto de vista político, portanto, já há uma derrota. Uma expressão disso é que a maioria da vanguarda da classe trabalhadora dos países ocidentais já identifica o Estado de Israel como um Estado repressor e opressor que está praticando um genocídio contra todo um povo. A maioria da juventude judaica dos EUA, país chave para a manutenção do Estado de Israel, já não se identifica com Israel e participa em massa das manifestações contra o genocídio na Palestina. Já está se dando uma derrota política para o sionismo, e a realidade do Oriente Médio já não será a mesma depois destes últimos meses.
Embora nem todos vejam que este regime nazista e racista necessita ser destruído e eliminado, o que só pode ocorrer de maneira violenta, o repúdio é cada vez mais estendido, tendo atingido as maiores universidades dos EUA, tais como Harvard e Columbia.
O problema está em que a maioria das organizações operárias, mesmo as que se apresentam mais à esquerda, apoiam, explicita, ou tacitamente a política de manutenção dos dois Estados e não desenvolvem uma política efetiva de apoio militar à resistência palestina.
Em virtude desta posição, a maioria das organizações não desenvolve uma política efetiva de apoio militar à resistência palestina, nem se faz uma política de exigência para que os governos da região rompam as relações com Israel, declarem-se solidários e apoiem o esforço dos palestinos para derrotar Israel militarmente.
Por outro lado, se aqueles que se dizem pela vitória da resistência, como o Hezbollah e o Irã apoiassem efetivamente e abrissem uma outra frente de combate, acelerariam a crise e a derrota militar do enclave sionista.
A farsa da democracia do estado de Israel
Israel tenta se apresentar como uma democracia, inclusive que respeita as minorias oprimidas, diferente dos outros países da região, como os Estados muçulmanos.
No entanto, o regime que existe é o de um estado colonial de apartheid, que pratica discriminação e segregação racial sistêmica de forma desumana para oprimir os palestinos. Na realidade, os cidadãos palestinos de Israel são de segunda classe e os palestinos dos territórios ocupados são submetidos a regras coloniais 3 sem ter nenhum direito. As prisões sionistas estão repletas, com milhares de prisioneiros palestinos presos sem sequer uma acusação formal, mas que ficam meses ou anos detidos sem ter acesso sequer a um julgamento.
Israel realiza eleições regulares, tem um parlamento, um Supremo Tribunal e instituições clássicas de uma democracia, e uma imprensa em alguma medida livre para os israelenses, mas nada para os árabes. A propaganda sionista fala todo o tempo de ser a única ‘democracia’ do Oriente Médio. Na verdade, esta democracia parlamentar é para os cidadãos judeus, pois os árabes são excluídos. Mesmo nela, uma série de decisões políticas e jurídicas autoritárias foram tomadas nos últimos anos apenas para salvar o poder do atual governo Netanyahu, que inclusive levaram a protestos de massa dos próprios israelenses nas ruas.
Na Cisjordânia, existe uma série de assentamentos judeus ilegais pelas normas do direito internacional e da ONU e, além disso, os muros que separam Israel dos territórios ocupados obrigam os palestinos que vivem nas cidades da área a passar por um emaranhado de postos de controle se quiserem se deslocar por esses territórios ou trabalhar dentro das fronteiras de Israel de 1967, nos quais são submetidos a humilhações diárias e retenção em filas por horas a fio. E os colonos judeus dessas áreas são a base para os agrupamentos diretamente fascistas que integram governos como o de Netanyahu e ministros importantes como Smotrich ou Bengvir que falam abertamente no extermínio físico dos palestinos.
O fato é que 5 milhões de palestinos que estão sob ocupação israelense não têm direitos nem mesmo a voto. Se todos que estivessem sujeitos à autoridade israelense tivessem o direito de votar, a maioria seria palestina. Se incluirmos os milhões de refugiados palestinos fora do país que gostariam de regressar à sua terra natal, o quadro se torna ainda mais complexo para os sionistas. Por isso, a maioria eleitoral sionista tem feito uma série de leis discriminatórias que visam limitar os direitos de cidadãos não-judeus de Israel cada vez mais.
Essas são as principais razões pelas quais muitos observadores internacionais não consideram Israel uma verdadeira democracia. Assim como as entidades de direitos humanos, cada vez mais, responsabilizam Israel por estar cometendo um genocídio com sua agressão assassina em Gaza e na Cisjordânia.
Israel não aceita o estado palestino
Apesar da farsa imperialista da política dos dois Estados, para os partidos que governam Israel, a única opção possível neste momento é uma solução de um Estado único, mas desde que se mantenha o status quo de um Estado com territórios ocupados e apartheid e nem consideram a possibilidade de um Estado palestino na Cisjordânia e em Gaza, onde os palestinos tenham plenos direitos políticos.
A saída democrática está na proposta original da OLP, de uma Palestina única, livre, laica e democrática. A política dos ‘dois estados” serve apenas para encobrir os países imperialistas que apoiam Israel com uma aparente política de “justo meio”, pois levantam essa posição para atrair um setor da sociedade palestina e para justificar sua posição pró-Israel e tentar dar credibilidade a seus esforços de impor uma ‘paz dos cemitérios’, que acabe com a revolta palestina. Mas o setor que simboliza essa política no interior da sociedade palestina, a ANP e seu líder Abbas tem cada vez menos apoio, e na verdade cumpre um papel de polícia interna da ocupação sionista.
A política de dois Estados também serve para ganhar tempo para levar a cabo o genocídio do povo palestino, à medida que Israel aumenta a sua ocupação territorial ilegal, inflando a imigração, e tentando crescer aumentando a natalidade entre as comunidades religiosas fundamentalistas.
A verdadeira política que se vê na realidade é a que afirma o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu: “Vamos transformar Gaza numa ilha deserta. Aos cidadãos de Gaza, eu digo: vocês devem partir agora. Iremos atacar todos e cada um dos cantos da faixa.” Para os sionistas, a alternativa para os palestinos é evacuar ou morrer com os palestinos não tendo para onde correr.
Israel não é invencível
A invencibilidade militar de Israel foi por terra. Seu grande desenvolvimento tecnológico e capacidade de monitoramento têm sido vendidos através de seus softwares espiões, como o Pegasus, para muitos países ao redor do mundo, incluindo países árabes.
Mas o ataque do Hamas em 07 de outubro demonstrou que o sistema de inteligência das forças de Israel, com seus drones de vigilância, suas câmeras de segurança e todo seu aparato de coleta de informações mostrou-se um fracasso.
Além da confiança em sua tecnologia militar Israel confiava em seu muro, construído com alto custo, que os combatentes palestinos simplesmente demoliram com escavadeiras e caminhões, passaram com motocicletas e jipes e sobrevoaram com asas deltas.
Os soldados que o guarneciam foram esmagados e demonstraram pouca resistência, mostrando que estavam com o moral baixo. Desmoralização que se reflete na incapacidade das forças armadas de derrotar a resistência palestina depois de 8 meses de combate e de toda a destruição provocada em Gaza.
Essa situação levou o principal porta-voz das Forças de Defesa de Israel, Contra-Almirante Daniel Hagari, a afirmar que “o Hamas é uma ideia” que não pode ser eliminada e não dizer isso é “jogar areia nos olhos do público“.
Recentemente, o New York Times publicou uma matéria, mostarndo que os principais generais de Israel defendem um cessar-fogo na Faixa de Gaza, mesmo com o Hamas mantendo o poder. Cresce a diferença entre o comando militar e o governo Netanyahu, que continua defendendo que a guerra só terminará “depois de ter atingido todos os seus objetivos, incluindo a eliminação do Hamas e a libertação de todos os nossos reféns“. Os generais admitem que estão subequipados para os combates, com menos munições, menos peças de reposição, e menos energia moral. 4
Estes fatos obrigaram Netanyahu a dissolver seu gabinete de guerra, ainda mais depois que o ex-ministro da Defesa Benny Gantz acusou-o de atrapalhar a “vitória real“. A divisão nos altos escalões do estado sionista é uma expressão do fracasso de sua ofensiva para esmagar a resistência. Netanyahu é acusado abertamente de manter a guerra para salvar seu mandato, já que uma vez que o conflito acabe, ele corre o risco de ser julgado inapto para o cargo por corrupção. Manifestações com dezenas de milhares de israelenses vêm crescendo, exigindo um acordo de cessar-fogo e que Israel aceite a proposta da resistência palestina e faça a troca de reféns israelenses por prisioneiros palestinos feitos por Israel em todos esses anos de ocupação.
A resistência palestina se mantém forte em Gaza e na Cisjordânia
Além de não ter conseguido destruir a resistência palestina em Gaza, o exército de Israel está sendo obrigado a renovar os combates mesmo nas áreas da Faixa que foram ocupadas. Apesar do governo Netanyahu afirmar que desmantelou o aparato militar da Resistência no norte da Faixa de Gaza, em janeiro de 2024, no bairro de al-Shujaiya, na Cidade de Gaza, estão se dando violentos combates há meses. Com as forças blindadas e de infantaria israelitas recebendo reforços e estando mais bem equipadas e com maior poder de fogo, apoiadas pela Força Aérea. Os combatentes da Resistência Palestina estão enfrentando as forças hostis e causando baixas em forma permanente ao inimigo nessa região.
Segundo informa o site Al Mayadeen, as Brigadas al-Quds da Jihad Islâmica Palestina (PIJ) atacaram os tanques israelenses Merkava 4, usando o Shawaz EFP, (uma ogiva autoformada) e foguetes (RPG) al-Yassin. Combatentes do Al-Qassam também enfrentaram as forças de ocupação em Tal al-Hawa, outro bairro no sul da Cidade de Gaza, disparando um RPG contra os soldados.
As forças de ocupação no assentamento de Netsarim e em Kissufim foram atacadas em suas bases militares por combatentes da Resistência, que dispararam vários tipos de projéteis de artilharia e foguetes em sua direção. 5
Depois da invasão terrestre da Faixa de Gaza, no final de outubro de 2023, a Resistência Palestina, com as Brigadas al-Qassam do Hamas, recuperaram capacidades operacionais eficazes em Jabalia e seu campo de refugiados, no norte de Gaza.
Em Rafah, a Resistência Palestina continua a enfrentar as forças de ocupação lançando foguetes contra instalações militares israelenses, como em Sufa, leste da cidade, e no bairro de al-Saudi, o local da base militar de Karem Abu Salem. Uma equipe de franco-atiradores da Al-assam conseguiu abater soldados israelenses perto da mesquita al-Shibli, no leste de Rafah. As Brigadas também dispararam foguetes RPG al-Yassin contra um APC israelense no bairro de Al-Saudi. No bairro de al-Shaboura, combatentes de Al-Qassam dispararam projéteis RPG contra os tanques israelenses Merkava.
Também na Cisjordânia, a resistência está infligindo perdas às tropas de ocupação sionistas. Em Jenin, as Brigadas Al-Quds estão enfrentando as forças de ocupação israelenses que invadiram a cidade. Com seus artefatos explosivos improvisados (IEDs). Na área de Sahel Marj Bin Aamer, no norte de Jenin, vários soldados israelitas foram feridos, no que foi chamado pelas Brigadas de “Operação Fúria de Jenin 2“. Veículos blindados israelenses foram destruídos, como o Panther Personnel Carrier (APC).
Essas são demonstrações de que a disposição dos combatentes da Resistência Palestina é de continuar a lutar contra a ocupação israelense até que esta seja derrotada na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. 6
Estes combatentes necessitam de apoio político, contrabandos de armas e de que as nações árabes e muçulmanas da região se unam e isolem Israel em toda a região.
As manobras imperialistas
Como a situação está adversa para Israel e os sionistas, apareceram outras propostas de saída negociada. Nos marcos da ONU, os integrantes do Conselho de segurança como China e Rússia tentam conseguir uma suspensão das hostilidades, para que os negócios voltem a fluir. Porém, esses países, apesar de algumas declarações e críticas ao Estado sionista, assim como os governos das nações árabes e muçulmanas, não fazem nada efetivamente para ajudar a Resistência. Todos se disciplinam às decisões do Conselho de Segurança, onde os EUA, com seu direito de veto, impedem qualquer política efetiva que obrigue Israel a recuar da invasão genocida a Gaza, e da repressão assassina na Cisjordânia.
De fato, esperam que Israel aplaste a Palestina para que a região volte à ‘normalidade’. Enquanto o imperialismo, por seu lado, unificado, fala sobre a política dos dois Estados, visando derrotar a resistência palestina com manobras protelatórias e dissuasivas.
Os EUA chegaram a falar em suspensão do fornecimento de ajuda militar a Israel, mas nada disso se efetivou, muito pelo contrário. 7 Os pedidos de mandados de prisão dos líderes de Israel e do Hamas apresentados no Tribunal Penal Internacional (TPI) expressam o repúdio massivo que está tendo o genocídio transmitido ao mundo com imagens ao vivo, mas não têm o poder de impedir a continuidade da invasão, nem o apoio militar decisivo dos EUA a Israel. E quando a Espanha, a Noruega e a Irlanda reconhecem formalmente a Palestina como Estado, é só para encontrar um caminho para estabilizar a situação, com o objetivo de ganhar tempo para a derrota da Resistência Palestina.
Um programa para a vitória militar
Por Israel ser uma potência militar que visa massacrar um povo em condições de inferioridade militar, além de ser fortemente apoiada pelas potências imperialistas, o esforço para sua derrota deve combinar uma série de fatores.
A começar pela mobilização da classe trabalhadora, com atos e manifestações, mas também com boicotes e bloqueios de materiais militares, a estilo do boicote aos produtos de Israel através do movimento do BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) e os embargos em portos e aeroportos ao comércio com o agressor genocida. Mas também é necessário que a solidariedade à Resistência Palestina, além de política, seja militar, com o envio de armas pelos países que reconhecem que há um genocídio.
Os Estados Árabes e da região devem romper com o Acordo de Abraham e declarar sua ruptura com Israel, a começar pelo Irã e Arábia Saudita. Mas não basta só romper relações políticas e econômicas. Além disso, os países da região devem regionalizar o conflito militar atacando o Estado sionista.
A causa palestina exige uma “nova Intifada regional”, com o apoio dos palestinos que vivem na Jordânia. O Egito e outros países vizinhos podem prestar apoio militar direto aos palestinos perseguidos e com suas vidas ameaçadas na Cisjordânia e em Gaza. O Hezbollah deve ter uma postura ofensiva contra Israel, partindo do conflito no sul do Líbano e no norte de Israel em solidariedade aos palestinos de Gaza e Cisjordânia. Além disso, os países da região devem se colocar claramente ao lado dos palestinos, colocando a agressão sionista como um conflito militar contra todas as nações árabes e muçulmanas da região e isolando o Estado sionista.
Acreditar em uma paz sem a derrota militar de Israel é uma utopia reacionária. Não há possibilidade de paz no SWANA ou a existência de uma Palestina Livre e Democrática sem a destruição do Estado de Israel.
Notas
- https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/o-colapso-do-sionismo-e-israel/ ↩︎
- Nota de Naftali Bennett. ↩︎
- Para que se veja a expressão dessa atitude colonialista, utiliza-se as regulamentações do período colonial britânico sobre a Palestina entre 1918 e 1947 nos casos que envolvem palestinos dos territórios ocupados. ↩︎
- Guerra em Gaza: Sem munições e energia, generais israelenses querem cessar-fogo no enclave palestino (globo.com) ↩︎
- Resistência palestina enfrenta nova invasão de al-Shujaiya | Al Mayadeen Inglês ↩︎
- Idem ↩︎
- A Casa Branca informou ao Congresso que planeja enviar mais de US$ 1 bilhão em novas armas para Israel. ↩︎
Publicado em julho de 2024 em www.litci.org/pt